quarta-feira, junho 20, 2012

Pequeno dicionário de termos médicos - Síndromes paraneoplásicas

Síndrome é todo conjunto de sinais e sintomas, e que podem ser causados por várias doenças. 

E o que é paraneoplásico? Este termo confuso mas não tanto vem do grego

De acordo com o The Free  Dictionary (link), a palavra vem do grego: para, próximo ou oposto a, neo de novo, ou seja, nova criação ou evolução, e plassein (plasia), moldar ou criar tecido. 

Resumindo, neoplasia é o nome que se dá aos tumores em geral, sejam eles benignos ou malignos. Neo significa novo e plasia, massa, ou seja, uma massa nova no corpo, crescendo. Quando a neoplasia é maligna, ou seja, apresenta crescimento desordenado, rápido e destrutivo, interferindo com as funções normais do órgão onde se encontra, ou mesmo do corpo inteiro, chamamos-na de câncer.

O termo para-, como falado acima, significa proximidade ou oposição a, ou seja algo próximo ou oposto ao tumor. Mas vamos explicar o que é isso na prática.

Imagine um órgão, por exemplo, um fígado, com um tumor maligno, um câncer. 

1. O câncer pode produzir dano a outros locais ou tecidos mesmo estando estes a distância. Como? Pode ser através de sua extensão para estes outros órgãos, como por exemplo, a extensão do tumor para as vias biliares, para a vesícula ou para o pâncreas. Daí, chamamos isso de invasão tumoral.

2. O tumor pode produzir metástases, ou seja, massas semelhantes a ele em locais distantes, que se propagam através das veias ou através do que chamamos de vias linfáticas, dutos separados dos vasos, mas que se comunicam com eles, e que carregam um líquido que banha as células chamado de linfa.

Observe abaixo:

http://www.afh.bio.br/imune/img/linfatico.gif
O sistema linfático, representado acima, é composto dos dutos, dos gânglios linfáticos (as ínguas que crescem em crianças ou adultos com infecções, sabem?), o timo e o baço. Sua função é drenagem da linfa e proteção imune, já que o líquido tem comunicação com órgãos, como o baço, o timo e os próprios gânglios linfáticos, que armazenam e amadurecem as células de defesa, os linfócitos T e B, e os anticorpos. A função destes órgãos, é logo, a filtragem da linfa e eliminação de corpos estranhos e germes (Fonte).

3. E o tumor pode causar danos a órgãos a distância, e mesmo ao corpo todo, levando a lesões em vários locais, inclusive o sistema nervoso central, sem nem mesmo tocar nele ou invadi-lo. E este meio de lesão é realizado através das síndromes paraneoplásicas.

As síndromes paraneoplásicas (SPN) são um conjunto de doenças que têm relação íntima com tumores, malignos ou mesmo benignos, mas produtores de substâncias que causam doenças sistêmicas ou neurológicas. Falamos no tópico anterior de doenças autoimunes. Falamos das reações cruzadas. Pois bem, aqui nas SPN, o que ocorre no caso das síndromes neurológicas é um ataque imunológico, por que alguns órgãos ou estruturas do sistema nervoso, ou algumas células, como do cerebelo ou dos nervos, possuem proteínas que se assemelham a proteínas do tumor. O sistema imunológico participa ativamente do ataque ao tumor, pois este cresce de forma demasiada e sem controle, podendo haver a produção de tecido anormal e não reconhecido pelo nosso sistema imunológico.

A presença de uma SPN indica que o sistema imunológico está ativo contra o tumor, mas nem sempre é uma presença benigna, pois por vezes a síndrome é grave, podendo causar mais incapacidade do que o tumor em si.

Os anticorpos produzidos nas SPN podem atacar uma proteína da superfície celular ou do núcleo. E há vários anticorpos, alguns específicos para cada doença, como o anti-Hu ou anti-ANNA1, que ocorre em formas de doença cerebelar paraneoplásica ou uma forma de inflamação do tecido cerebral chamada de encefalite límbica, o anti-Hi, o anti-Yo na degeneração cerebelar paraneoplásica, o anti-anfifisina, na síndrome do homem rígido (uma forma de contração muscular exagerada com dor e rigidez difusa, rara), e outros anticorpos.

Há também várias síndromes paraneoplásicas, algumas mais benignas, outras mais graves, e muitas, quando corretamente diagnosticadas, sugerem a presença de um tumor. Isso por que nem sempre o tumor é o que aparece primeiro. Apesar de muitos pacientes apresentarem as SPN já no contexto do tratamento de um tumor, muitas vezes a síndrome vem primeiro, mesmo anos antes do tumor (até 5 anos de acordo com a literatura especializada) e o tumor pode aparecer logo, quando pesquisado, ou pode-se pesquisar o paciente todo sem se achar nada, o tumor só aparecendo muito tempo após (como falado acima, geralmente no máximo 5 anos após o início da SPN).

Também, deve-se ter em mente, também, que há várias causas para uma determinada síndrome, e um câncer é somente uma de várias causas. Pesquisa-se avidamente pela presença de um tumor em um paciente que apresenta uma doença que sugere muito ser paraneoplásica, mas pode-se não achar nada, agora e nem nunca, e a causa ser outra completamente diferente, como uma doença autoimune qualquer ou uma doença infecciosa.

Quanto às síndromes, há doenças dos nervos (polineuropatias), atrofia cerebelar, encefalites, doenças semelhantes a derrames, doenças musculares causadas por anticorpos contra alguns tipos de cânceres, etc...

Há uma forma de SPN muito comum chamada de miastenia gravis, discutida com detalhes neste blog, causada pela produção de anticorpos no timo contra a junção entre o nervo e mo músculo (junção neuromuscular).

O diagnóstico é feito com exames direcionados para as prováveis causas. Primeiro, deve-se diagnosticar a síndrome, ou seja, qual síndrome neurológica é, o que pode fazer muita diferença na pesquisa da causa do problema, e isso se faz com o exame clínico e neurológico. No auxílio ao diagnóstico, tanto da síndrome como da causa, podem-se colher vários exames de sangue, tomografia e ressonância da cabeça ou coluna, pesquisa de anticorpos específicos (disponível somente em certos centros), eletroneuromiografia, eletroencefalografia.

No diagnóstico do tumor, devem-se realizar exames direcionados para a provável localização e tipo do tumor, desde radiografia de tórax e tomografias a ultrassonografias e exame de sangue.

Quanto ao tratamento, isso deve ser discutido com o seu médico.