quinta-feira, março 14, 2013

Malformações cerebrais - Microcefalia


Microcefalia é o termo dado aos casos de circunferência da cabeça significativamente menor em relação a pessoas da mesma idade e sexo, ou seja, ao conjunto ossos cranianos + cérebro. Deve-se distinguir de microencefalia, quando há diminuição do crescimento do cérebro, mesmo com o crânio de tamanho normal, não sendo um diagnóstico tão direto como o é o da microcefalia. A microcefalia não é uma doença, mas uma síndrome, e pode ser encontrada em várias doenças neurológicas, várias síndromes genéticas, e várias outras condições clínicas.

Há causas genéticas e não genéticas, sendo que a microcefalia primária ou congênita é a que está presenta logo ao nascimento. A microcefalia secundária ou adquirida ocorre quando a circunferência craniana é normal ao nascimento, mas à medida que a criança cresce, o tamanho da cabeça não acompanha este crescimento.

A síndrome pode ser acompanhada, dependendo da causa, de paralisia cerebral com alterações motoras, crises epilépticas, retardo do desenvolvimento motor e/ou retardo mental. A presença pura e simples de microcefalia não garante alterações motoras ou mentais, e crianças com crânio abaixo da média podem ser cognitivamente normais. 

Outras situações, especialmente as síndromes cromossômicas ou outras doenças genéticas, podem apresentar microcefalia acompanhada de alterações em outros órgãos, alterações da face (dismorfismo facial), e outras alterações físicas. 

Os fatores de risco para microcefalia são vários, mas pode-se enumerar infecções do período neonatal, AIDS materna, desnutrição materna, exposição a substâncias causadoras de malformações (teratogênicas), uso de álcool pela mãe no período neonatal, uso de drogas como cocaína. Crianças que apresentaram no período durante o nascimento asfixia (queda de oxigenação) ou infecções cerebrais, como meningoencefalites (inflamações/infecções das membranas que recobrem o cérebro - as meninges - e o próprio cérebro) podem apresentar microcefalia adquirida. Fora isso, história familiar de microcefalia pode sugerir distúrbios genéticos relacionados a essa alteração física.

Nos EUA, 0.56% da população apresenta microcefalia. 

A prevenção da síndrome requer:

1. Evitar substâncias que causem danos à criança ainda no útero - Qualquer medicação que a gestante venha a usar deve ser discutida com o médico que prescreve ou com o obstetra antes do uso - evitar usar medicações sem prescrição médica.
2. Evitar na gestação o uso de álcool e drogas.
3. Evitar o contato com radiação ionizante, como no caso de radiografias e tomografias, ao menos que sejam estritamente necessárias e após avaliação do obstetra.
4. Tratamento de doenças maternas, como a fenilcetonúria, distúrbio de metabolismo de aminoácidos que é muito comum e de fácil diagnóstico.
5. Evitar infecções no período pré-natal - ou seja, fazer um bom exame e acompanhamento pré-natal, e uso de vacinar propostas pelo obstetra. 

Mais informações sobre acompanhamento e tratamento devem ser obtidas com o pediatra que acompanha a criança ou o obstetra que acompanha a gestante. 

Pequeno dicionário de termos médicos - Síndrome clinicamente isolada

Síndrome é todo o conjunto de sinais e sintomas relacionado a uma ou mais afecções, não determinando exatamente uma doença, mas podendo ser comum a um grupo de doenças. Assim, uma síndrome neurológica pode apresentar vários sintomas, mas que são causados por doenças semelhantes ou diferentes. Como exemplo de síndrome, temos a própria dor de cabeça, que possui inúmeras causas.

A síndrome clinicamente isolada (aqui denominada, a partir de agora, CIS - Clinically Isolated Syndrome) é o nome dado ao conjunto de sinais e sintomas que sugerem um surto de esclerose múltipla (EM), mas que ocorre em pacientes sem história prévia de EM ou de qualquer quadro sugestivo de surto de EM (um surto é um quadro de déficits neurológicos que dura mais de 24 horas). Ou seja, pode ser o primeiro surto de EM (quando falo "pode ser", indico que há várias causas para os sintomas apresentados pelo paciente, e uma delas é EM).

A CIS foi descrita pela primeira vez em 1993, sendo que seu diagnóstico melhorou com a evolução dos critérios de diagnóstico e dos exames de imagem, como a ressonância magnética (MRI). Fora isso, o avanço nas medicações para tratamento da EM exigiu um diagnóstico mais precoce e mais correto da  doença. 

O diagnóstico de EM a partir de uma CIS depende de vários critérios, como tipo de surto (neurite óptica, mielite transversa - inflamação da medula), evolução do surto, e presença ou não de lesões na MRI. Mas a avaliação inicial exige que afastemos outras doenças que possam causar os mesmos sintomas. 

As CIS mais comuns são neurite óptica (leia mais sobre isso aqui), mielite transversa (leia mais sobre isso aqui), síndromes de tronco cerebral (síndromes que afetam as partes do tronco - mesencéfalo, ponte e bulbo - e não são devidas a tumores, infecções ou derrames), e síndromes motoras e sensitivas sem causa infecciosa, vascular ou tumoral. Os sintomas usualmente se desenvolvem como os surtos, ao longo de horas ou dias, e persistem por dias a semanas, sendo iguais aos surtos de pacientes com EM (a diferença, como apontado acima, é que a CIS é em geral o primeiro surto de EM). A recuperação pode ser completa ou com sequelas, ao longo de dias a semanas.

O diagnóstico deve ser o mesmo de um surto de EM. Inicia-se com a história clínica completa (anamnese) e um exame neurológico completo. Uma MRI do crânio e coluna cervical são usualmente solicitados, não somente para diagnóstico de outras doenças que dão sintomas semelhantes, mas também para avaliação da progressão da CID para EM (a presença de lesões em mais de um local (disseminação do espaço) e com várias idades (disseminação no tempo) sugere progressão para EM). A MRI é mais sensível que a tomografia na detecção de lesões de EM. 

Na presença de dúvida diagnóstica, pode-se solicitar o líquor lombar com pesquisa de bandas oligoclonais (leia mais sobre isso aqui), que tem sensibilidade de 88% (ou seja, 88% dos casos de CIS evoluindo para EM terão bandas positivas) e 43% de especificidade (ou seja, 43% dos casos negativos para EM terão ausência de bandas oligoclonais). Há várias outras doenças que produzem bandas oligoclonais no líquor, como algumas inflamações reumáticas, sarcoidose, algumas doenças causadas por câncer (síndrome paraneoplásicas - leia mais sobre elas aqui), e outras. 

Outros exames devem ser solicitados na dependência da avaliação do médico que assiste o paciente. 

O diagnóstico e o tratamento rápidos de uma CIS são importantes pois, apesar de não impedirem o desenvolvimento de EM, podem retardar a evolução da doença, e melhorando a qualidade de vida do paciente. 

Sobre o tratamento, falaremos mais dele na seção de tratamento da EM.