sexta-feira, maio 03, 2013

Novidade sobre genética em enxaqueca


Esta notícia foi publicada no site FoxNews (leia o original aqui) em 01/05/13, e refere-se a um estudo publicado por Louis J. Ptacek et al na revista Science Translational Medicine de 01/05/13 (original).
Nova pesquisa da Universidade da Califórnia em São Francisco identificou uma mutação genética ligada às crises de enxaqueca. A mutação ocorre em um gene (parte do DNA que produz proteínas) chamado Casein Kinase I delta (CKIDelta), que produz uma proteína chamada CK2, sendo que é a primeira vez que pesquisadores identificam uma mutação genética à enxaqueca comum.
Nota do autor: Há mutações identificadas para doenças que possuem a enxaqueca como sintoma, como a enxaqueca ou migrânea hemiplégica familiar, que cursa com dor de cabeça e paralisias e dormências que duram dias a semanas; mas aqui temos um gene diretamente envolvido com as dores de cabeça enxaquecosas comuns, que evoluem somente com dor de cabeça, ou no máximo auras. Antes, os cientistas haviam identificado genes de suscetibilidade, ou seja, genes cuja presença aliada a fatores ambientais poderiam predispor uma pessoa a ter enxaqueca, mas agora temos um gene que determina a enxaqueca. 
Ainda assim, os cientistas não sabem exatamente o que causa as crises de enxaqueca (ainda não sabemos todas as causas, mas estamos trabalhando nisso). 
Os cientistas descobriram o gene estudando a genética de suas famílias com história de enxaqueca. Eles observaram que uma grande proporção de pacientes com enxaqueca ou tinham genes que sofreram mutações, ou tinham pais ou mães que carregavam os genes modificados. Os pesquisadores então, no laboratório, identificaram como a mutação afeta a produção do gene, que tem muitas funções importantes no cérebro e no corpo.
Depois de observar a presença do gene em humanos, eles observaram os efeitos do gene modificado em uma linhagem de camundongos (assim, podemos não somente observar os efeitos mais apropriadamente, mas também confirmar que a presença do gene leva aos efeitos observados em humanos). 
Os camundongos com o gene modificado tiveram limiar de dor menor em comparação aos que não tinham a mutação (um menor limiar de dor indica que a percepção de dor está aumentada, com níveis menores de dor sentidos mais intensamente).
Da mesma maneira, os camundongos com o gene mutado foram mais sensíveis e menos tolerantes a uma técnica de estimulação denominada depressão cortical alastrante, uma onda de despolarização elétrica que começa na parte de trás do cérebro e o percorre, e que ocorre antes das crises de enxaqueca, sendo a base para as auras sentidas em cerca de 30 a 40% dos pacientes com enxaqueca (e que, curiosamente, foi descrita por um pesquisador brasileiro, Aristides Leão, em 1944 - leia mais aqui).
Além disso, os pesquisadores demonstraram que células de suporte dos neurônios, os astrócitos, também estavam alterados nos camundongos com o gene modificado, com aumento da sinalização com cálcio (isso pode levar a aumento dos níveis de glutamato, um neurotransmissor excitatório, e a estresse oxidativo - radicais livres - e inflamação neuronal).
Este estudo adiciona mais um bloco no caminho de se descobrir as vias proteicas da enxaqueca, e consequentemente, melhores tratamentos. 
Há, certamente, ainda mais mutações da enxaqueca a serem descritas. Mas temos que dar um passo de cada vez. 

O que é a estimulação magnética transcraniana


A estimulação magnética transcraniana (ou TMS, para a sigla em inglês) envolve a estimulação superficial, não invasiva, do cérebro através de corrente elétrica gerando pulsos magnéticos. 

Não é exatamente um método novo, e pedras magnetizadas já eram usadas em terapias empíricas por médicos da Grécia e do Egito antigos. Já no século 18, Franz Mesmer afirmava poder curar doenças através do magnetismo (ele fora o criador do Mesmerismo, ou teoria do magnetismo animal). Em 1898 e em 1910, foram registradas as primeiras tentativas científicas de usar o magnetismo para alterar a atividade cerebral. O uso de grandes imãs aplicados no córtex da parte posterior do cérebro (o lobo occipital, responsável pela visão) provocou o aparecimento de flashes de luz em pessoas normais.

Já no século 20, há registros de vários tratamentos  para doenças neurológicas na Europa utilizando-se a força eletromagnética. Em 1980, Merton e Morton estimularam a área do córtex cerebral responsável pela movimentação (o córtex motor) sem ter de abrir a cabeça da pessoa. 

Mas foi somente na década de 90 do século passado que a TMS começou a se desenvolver como técnica de diagnóstico, tratamento e pesquisa. Observou-se a utilidade da técnica, que era fácil de ser aplicada, indolor e sem necessidade de cirurgia de qualquer tipo. 

Em 2009, finalmente a FDA (órgão regulamentador de saúde dos EUA) aprovou um aparelho, o NeuroStar TMS System ® (veja abaixo) para o tratamento de depressão maior resistente às medicações antidepressivas.

http://tmsofwestchester.com/wp-content/uploads/2011/09/TMS_Of_Westchester_NeuroStar_Coil.jpg

https://encrypted-tbn3.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcTVd5uoAxHzEHACTaw8owWIznxiFP2-HaVf9BdjJhtda8-yQvV7

Acima, vemos o estimulador (na verdade, um gerador de campo magnético) sendo aplicado ao couro cabeludo de pacientes. 

Mas qual a base científica desse procedimento?

Um campo magnético nada mais é do que o produto da passagem de uma corrente elétrica por um condutor. Sabe-se também que o cérebro, assim como todo o corpo, possui eletricidade gerada através da interação entre os vários íons (átomos carregados eletricamente de sódio, potássio, cálcio, cloro). Na verdade, o estimulador acaba por conectar o campo magnético externo, criado, ao campo magnético normal do cérebro. 

https://encrypted-tbn1.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcRzk0noRvJmZGJeSgsy7a5JEnzZiZ-osyi52bQ9ZlWNYUV6z3VDYw
Corrente elétrica através de um condutor gera um campo magnético.

Há vários estudos que documentam os efeitos fisiológicos da TMS, tanto com pulsos únicos de estimulação como com pulsos repetidos. Pode-se observar modificações nas propriedades eletroquimicas dos neurônios (os neurônios possuem alto metabolismo e suas sinapses são eletricidade pura), que persistem por algum tempo mesmo após a parada da estimulação. Esta estimulação pode, digamos, corrigir atividades anormais dos neurônios.

Os mecanismos da TMS são vários. Modificações de neurotransmissores, diminuição do estresse oxidativo (por radicais livres), indução de genes (algo ainda mais interessante, porque mexe com o DNA), modificações no fluxo sanguíneo cerebral, são algumas das possibilidades de ação da TMS.

As indicações variam, e tendem a crescer. Se você souber ler em inglês, tiver curiosidade, e acessar a página da PubMed (vá aqui) colcocando nos termos de pesquisa Transcranial Magnetic Stimulation (TMS), você encontrará 8993 artigos sobre o assunto, lidando com os mais variados temas, desde pesquisa clínica, diagnóstico de várias condições até tratamento de várias doenças, e mesmo reabilitação pós-AVC.

Algumas doenças podem se beneficiar da técnica, como depressão e transtorno bipolar, epilepsia, enxaqueca, dor crônica, e talvez doenças degenerativas como esclerose múltipla, doença de Parkinson e doença de Huntington (leia mais sobre isso aqui).

Nos próximos posts, falaremos mais sobre esta técnica no tratamento de várias doenças neurológicas, e esboçaremos comentários sobre o tratamento da depressão.